A imunidade dos vereadores


O assunto de hoje tem assento no art. 29, inciso VIII da Constituição Federal, onde se prevê "inviolabilidade dos Vereadores por suas opiniões, palavras e votos no exercício do mandato e na circunscrição do Município”.

A imunidade é uma proteção conferida pelo legislador constituinte aos membros do poder legislativo para que possam exercer suas atribuições com independência e imparcialidade para o bom desempenho de suas funções. Basicamente é um conjunto de garantias voltadas ao livre exercício da função parlamentar.

O poder legislativo não é simétrico nas três esferas, pois, conforme sabemos, na União ele é bicameral, ao passo que em âmbito estadual e municipal ele se faz unicameral. Da mesma forma, a imunidade garantida aos seus membros também não obedece a uma simetria. Enquanto a Constituição Federal fala em imunidade formal e material aos membros do poder legislativo federal, estadual e distrital, a imunidade conferida aos vereadores se restringe a esfera material.

Resumidamente, a imunidade material é aquele que recai sobre o que se diz no exercício da função e a imunidade formal se relaciona com o processo e a prisão.

Somente ao proferir suas opiniões, palavras e votos (leia-se, em suas atividades próprias), os vereadores serão inimputáveis, não sendo processados e julgados em tais situações civil e penalmente. Há que se atender a dois requisitos, porém:

a) A imunidade parlamentar precisa guardar pertinência temática com as funções parlamentares.
b) As palavras proferidas precisam ser proferidas nos limites da circunscrição do Município.

Assim, a imunidade material, ao contrário do que se possa vir a pensar de inopino, não é um cheque em branco, hipótese que transformaria a tribuna num palco para chacotas e bravatas. Terá o vereador proteção no desempenho do mandato e no âmbito do território municipal, a qual se traduz no trancamento da ação penal relativa aos crimes contra a honra, respectivamente a calúnia, a injúria e a difamação (arts. 138, 139 e 140 do Código penal).

Este ano, o juiz catarinense Geomir Roland Paul, titular do juizado especial cível da comarca de Rio do Sul afastou a imunidade, ao condenar um vereador a indenizar outro por danos morais, conforme notícia amplamente divulgada pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina (notícia). A decisão veiculada em 02 de julho de 2015 tratou de um vereador condenado a indenizar outro moralmente em razão de acusá-lo, sem provas, de fazer ameaças de morte.

Diante da força dos precedentes, endossada com o novo Código de Processo Civil, merece atenção o recente julgado emitido em sede de repercussão geral por nosso Supremo, onde o Plenário deu provimento ao Recurso Extraordinário (RE) 600063 e reconheceu a existência da imunidade de vereador que teria ofendido a honra de outro (notícia). Para os Ministros, ainda que ofensivas, as palavras proferidas pelos vereadores no curso do mandato e dentro da circunscrição municipal gozam de imunidade, logo, estes não praticam crimes contra a honra.

Muito pertinente, posição na qual nos filiamos, a Ministra Rosa Weber advertiu quanto a gravidade de juízes realizarem juízo de valor sobre as declarações emitidas pelos parlamentares. Segundo ela, a imposição de uma valoração específica a cada manifestação de membro do Legislativo municipal retiraria a força da garantia constitucional da imunidade.

Cabe aduzir que o STF já reconheceu ser presumida a imunidade quando a ofensa é realizada dentro da Casa legislativa, não havendo necessidade de demonstrar conexão com o mandato (Inquérito 1958).

A imunidade não serve para acobertar abusos e permitir que as sessões e discursos proferidos por parlamentares extrapolem o bom senso, como pode ilustrar o vídeo acima. Aquele que agir de forma alheia ao decoro, poderá vir a ter a imunidade afastada, pois não se esta diante de um privilégio, um benefício individual, e sim uma garantia. Cabe lembrar que ainda que presente a imunidade, tal não impede que o vereador seja responsabilizado na esfera política, no âmbito da própria Casa legislativa que poderá submetê-lo a diferentes sanções. Tipificada a conduta como infração política administrativa, face o princípio da independência das instâncias, a imunidade parlamentar não impedirá que o vereador eventualmente seja responsabilizado perante a lei orgânica do Município e o Código de Ética de Decoro Parlamentar.

Por outro lado, necessário ponderar que um parlamento atuante necessita de parlamentares atuantes. Que seus membros não estejam sujeitos a represálias e pressões externas. Assim, observa-se que a imunidade constitui um importante direito e não merece ser equivocadamente interpretada pela comunidade. Apesar do desprestígio dos políticos como um todo perante a opinião pública, problema, alias, de ordem mundial, certo é que o exercício do mandado requer condições de exequibilidade.

Postar um comentário

0 Comentários